dezembro 2015 | Teresa sem medo

Celebrar ou não celebrar o Aniversário?

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O que diz sobre as nossas emoções e sobre a nossa saúde?  

Celebrar o aniversário pode parecer divertido, desejado e importante, mas esta ocasião não é vista da mesma forma por todas nós. E nem falamos da logística que uma comemoração pressupõe.

A questão existencial, mais profunda, é que comemorar o aniversário leva-nos a reflectir sobre a nossa vida e a questionar as nossas prioridades. É uma época de balanço. Este facto também caracteriza outras datas, como o Ano Novo e o Natal. No entanto, embora também sejam celebrações, estas datas não são percepcionadas como algo pessoal. São datas que não dizem respeito apenas a nós, individualmente, mas a todos.

Há alguma relação entre celebrar a vida e a saúde? 

Não podemos afirmar que quem não comemora o aniversário possui menos saúde do que quem o faz.
O que sabemos é que a comemoração do aniversário, ou de qualquer outro marco importante na nossa vida, contribui para a construção equilibrada da noção do Eu. Contribui para sedimentar a consciência de quem somos e sobre a fase do percurso em que nos encontramos. Existencialmente, quando recusamos olhar para o caminho já feito (tomar consciência do tempo que passou) privamos a construção saudável do nosso futuro.

Pode ser mais confortável “não ligarmos” à data que marca a comemoração do nosso nascimento, mas tal não significa que estejamos a ter a atitude mais equilibrada para a nossa vida. Recordando o que nos diz E. Minkowsky, um dos expoentes da corrente psicoterapêutica existencial, quando evitamos olhar para a nossa escala temporal adoecemos. Entramos em angústia existencial, em ansiedade e deixamos de nos projectar no futuro de forma positiva e saudável. Ficamos saudosistas. Achamos que os anos da nossa juventude é que foram felizes. Ou usamos qualquer outra desculpa, desde que consigamos interromper a linha do tempo que teima em passar.

Assim sendo, celebrar o aniversário faz bem ao nosso equilíbrio emocional e psíquico. Logo, tem uma relação directa com o nosso bem-estar emocional e, consequentemente, com a nossa saúde. Quem não se sente bem consigo não está num estado de saúde pleno.


Por que é que há pessoas que adoram festejar o seu aniversário e outras que se recusam a assinalar este dia?

Em termos existenciais há quem não consiga ver alegria em celebrar seja o que for e não encontre factos da vida possíveis de celebração. Sobretudo, o aniversário!

Nestes casos poderemos estar a falar de pessoas que estão em contexto de apatia perante a vida, de angústia existencial e, nas situações mais graves, em estado depressivo. Estas pessoas não conseguem olhar para o que a vida tem de bom, por pouco que esse bom possa parecer em determinados momentos. Martin Heidegger refere que o Eu recusa a finitude. Ou seja, não celebrar o aniversário é uma das estratégias que usamos para esconder de nós mesmos que não temos todo o tempo do mundo.

O curioso é que a própria palavra Aniversário liga o tempo à existência, e, como bem sabemos, a nossa humanidade tem dificuldade em aceitar as limitações que o tempo nos coloca. No ponto inverso da escala, temos as pessoas que adoram festejar o aniversário. Estas, teoricamente, estão em equilíbrio com a vida: possuem uma boa auto-estima, um auto-conceito positivo, saúde, amigos e uma estrutura familiar saudável.


Que factores podem estar na origem da recusa em celebrar o aniversário? 

Gostaria de referir que as pessoas que recusam comemorar o aniversário podem estar a sofrer do ponto de vista emocional. Poderão ser pessoas que sofrem da ferida de abandono ou que têm medo de não serem aceites, nem amadas. Estas pessoas adoptam comportamentos de minimização da data, usando frases de tipo: “Ora! É apenas mais um ano! O que é que isso tem de mais? Estou a ficar mais velha! Apenas isso!”. No entanto, por trás deste diálogo está alguém que necessita que se preocupem com ela, que olhem para ela e que lhe dediquem atenção. Algo que a pessoa, no fundo, deseja muito, mas não consegue demonstrar.

Não celebrar, e fazer disso bandeira, dá a estas pessoas a ilusão que são elas que estão a dominar a situação. Que conseguem controlar as suas emoções. Que não ficam à mercê do poder do outro. Colocando-se “fora de cena” evitam ser ignoradas ou não lembradas.


Não celebrar o Aniversário pode ter contornos psicopatológicos? 

Existem estudos sobre Psicologia do Aniversário que apontam no sentido da existência de cenários psicopatológicos por parte de algumas pessoas. Há inclusive Psicólogos, entre os quais se destaca Christian Heslon, cuja investigação confirma uma relação directa entre a data do aniversário e o surgimento de comportamentos patológicos no indivíduo, como a tristeza, o isolamento, a angústia, a sensação de incapacidade para continuar a aguentar a vida, e, nos casos mais severos, o suicídio (tentado ou efectivo).

Alerto que, por princípio, não devemos falar em casos de depressão, até porque para o diagnóstico diferencial de depressão o tempo tem de ser considerado. Ou seja, ficar deprimida alguns dias representará, não tanto um quadro depressivo mas aquilo a que se chama episódio depressivo. Este tipo de fenómeno, conhecido como «blue birthday» tem de ser sempre entendido em contexto não sendo comum em pessoas saudáveis sem queixas psicopatológicas anteriores.


Sentir-se confortável por não celebrar o aniversário

Há pessoas que se sentem efectivamente confortáveis por não celebrarem o seu aniversário. No entanto, tal não significa que esta atitude seja aquela que mais felicidade traz para as suas vidas.

São pessoas que aprenderam a isolar-se nesse dia por alguma razão. Por vezes, nem estão conscientes do que provocou isso. Isolar-se tornou-se algo natural para elas chegando mesmo a planear jantar sozinhas ou ir dormir fora para um hotel. É também comum desligarem o telefone, não responderem a e-mails ou mensagens de parabéns nas redes sociais.

Estas pessoas contestam todos os argumentos que lhe apresentem em contrário e quando têm família constituída preferem um jantar simples e restrito onde não existam manifestações que indiciem celebração, como cantar os Parabéns ou brindar.


Qual a importância de festejar o aniversário? Devemos festejar?

Sim. Devemos celebrar o aniversário pois tal atitude simboliza a celebração da nossa própria vida.
Mesmo que por vezes as situações difíceis nos pareçam insuportáveis o facto de termos iniciarmos mais um ano deve honrar a nossa resiliência! A nossa capacidade infinita de dar a volta por cima, mesmo quando só nos apetece desistir.

 Ter consciência da finitude deverá pois ser um incentivo para recomeçarmos as vezes que sejam necessárias para cumprirmos o nosso propósito. Para vivermos de acordo com o que sentimos e para sermos autênticos connosco.

Em termos sociais, será bom aproveitarmos o nosso aniversário para definitivamente iniciarmos um estilo de vida mais de acordo com o que queremos de verdade e não uma vida construída a partir do que as outras pessoas querem ou acham ser o melhor para nós.

Seja a nossa vida longa ou não, o facto é que ninguém tem todo o tempo do mundo. E, tendo a certeza disso, como vamos escolher viver? Não podemos também esquecer que o aniversário é um dos pilares culturais da sociedade. Alejandro Klein, Professor e Investigador do Instituto de Psicologia da Universidade de S. Paulo, a data do aniversário é importante para o estabelecimento da nossa biografia pessoal e para nos situarmos numa cronologia de vida, sem a qual perderíamos a referência de quem somos. No entanto, este especialista explica que é importante que cada pessoa adopte a forma como mais gosta de viver o aniversário, pois “a sociedade pressiona-nos para que todos façamos as coisas de um modo semelhante!”.


Qual é a importância e o significado da festa de aniversário para as crianças, adolescentes, adultos e os para os mais velhos? São diferentes?

A diferença é enorme pois cada idade apresenta uma relação própria do Eu com o Tempo. A celebração da idade que temos é o nosso grande confronto com a finitude. Com a escala de tempo da vida. Inicialmente, nem percepcionamos a escala temporal. Mas à medida que vamos acumulando anos à nossa vida, vamos tomando consciência da noção de fim. É como se nos dissessem: “Atenção! É tempo de pensares na tua vida e como a queres viver a partir de agora.” Este confronto do Ser com o Tempo é ancestral. Martin Heidegger alerta exactamente para isso: o ser realiza-se no Tempo (mais que no espaço). Pois o Ser pode mudar e condicionar o espaço, mas jamais consegue interferir no Tempo. O Tempo continuará a passar. Por muito que o tentemos iludir ou esconder.

Assim sendo, as crianças ainda não conscientes do tempo que se esgota, ficam impacientes com o dia de aniversário (que nunca mais chega) e sobretudo com a festa de anos. Esta comemoração serve ainda para se sentirem reconhecidas pela família e amigos. Os presentes são indispensáveis e não é por acaso que as crianças não gostam de receber roupa e preferem brinquedos!

Na adolescência, a celebração do aniversário perde o contexto familiar e é uma ocasião de afirmação perante o grupo. Afirma a noção de pertença e a constituição de “escalas de poder” perante os outros.

Já na idade adulta, começamos a dar importância aos grandes marcos! E estes medem-se em décadas. O primeiro grande marco são os 30 anos. Depois os 40 e finalmente os 50.

Para as mulheres sem filhos e sem uma vida emocional estável a década dos 30 anos é a mais complexa e a passagem da década dos 40 para a dos 50 é vivida, nalguns casos, de forma muito angustiada. É a fase do confronto não com a finitude, enquanto tal, mas com o fim da época áurea dos anos de juventude. É a fase dos balanços.

Na idade da aposentação comemoramos o aniversário com alegria se nos sentirmos felizes e tivermos objectivos de vida, um propósito que nos continue a oferecer uma razão para continuar. Caso contrário, a fase da reforma transforma-se no início do envelhecimento “real”.


Os homens e as mulheres vivem o aniversário da mesma forma?

Mais uma vez não podemos generalizar e tudo deve ser visto em função da idade que fazemos.
A data do aniversário costuma ser mais sentida pelas mulheres. Faz-nos pensar (de modo não muito positivo), na idade que temos. Temos pensamentos recorrentes sobre o facto de estarmos a envelhecer e questionamos o que temos feito e o que devíamos começar a fazer por nós.

Valéria Meirelles, psicóloga, co-autora do livro Mulher do Século XXI, defende que existe uma maior punição social para as mulheres no que respeita ao processo de envelhecimento, sendo comum não gostarem da data. Por volta dos 50 anos, inclusive, as mulheres passam muitas vezes por uma fase complicada associada ao seu auto-conceito e à perda de auto-estima relacionada com a menopausa, que leva as mulheres a sentirem que estão a perder a sua capacidade de sedução. No processo de envelhecimento, os homens não sentem os 50 anos.

Segundo o Investigador e Psicólogo Christian Heslon, os homens apreciam os seus aniversários e aproveitam a data para se mostrarem e valorizarem. O especialista refere que as mulheres são mais discretas neste âmbito mas lidam mal quando o companheiro se esquece da sua data de aniversário. Muitas vezes gostam mais de festejar o aniversário dos seus filhos do que o seu. Mais tarde os papéis invertem-se: aos 70 e 80 anos, as mulheres aceitam o envelhecimento muito melhor que os homens.

Esta é uma das razões de origem psicológicas apontadas pelos especialistas para a maior longevidade das mulheres.


Qual a importância das velas, do bolo e dos presentes ou seja dos rituais associados a este dia?

Embora a maioria de nós não saiba, cada ritual da comemoração do aniversário tem uma raiz mítica, espiritual ou histórica. Não resisto a falar de algumas crenças associadas à exteriorização da festa. Assim, é comum encontrarem-se referências às velas como símbolo do tempo que passa, a chama da vida e, no final, o apagar.

O bolo provém de um antigo culto a Artemisa, Deusa da Lua e da Fecundação, evocada pela forma redonda do bolo. O facto do bolo ser partilhado entre amigos simboliza uma união ancestral para afastar a morte.

O presente simboliza o primeiro objecto de amor perdido entre a mãe e o bebé quando é cortado o cordão umbilical.

Todos estes rituais são importantes porque conferem ao aniversário uma dimensão simbólica, que veio substituir os rituais de passagem antigos. Mas, quer se valorize ou não a mitologia, os rituais associados à celebração do aniversário devem ser encarados como uma celebração da própria vida.


Quais são os principais efeitos psicológicos do envelhecimento? 

Ninguém gosta de envelhecer. Envelhecer pode significar um golpe emocional difícil de ultrapassar gerando efeitos psicológicos como a angústia, a ansiedade, a tristeza e até depressão.

Estes efeitos psicológicos surgem com a perda da nossa autonomia, do nosso auto-controlo, das nossas capacidades mentais e biológicas, da nossa auto-estima e da nossa capacidade para nos sentirmos úteis, capazes e desejadas.  


O que podemos fazer para melhor gerir a passagem dos anos? 

  • Desde sempre, cuidar de nós com carinho, o que significa fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para ter uma boa auto-estima. 
  • Cuidar dos nossos afectos reunindo à nossa volta amigos e família com quem possamos partilhar as nossas ansiedades e as nossas alegrias. 
  • Não parar de fazer planos e a ter objectivos. 
  • Recordar as nossas experiências positivas e os nossos êxitos. 
  • Manter a paixão pela vida e pelos outros. 
  • Focar-se na gratidão pelo que tem e conseguiu e desfocar-se da carência. 
  • Manter-se em actividade. Fazer exercício físico sem esquecer o treino cerebral. Nunca deixe de aprender, de estudar, de conhecer novas realidades.
  • Cuidar da sua saúde. A saúde faz-nos sentir mais jovens. 
  • Não pensar no envelhecimento como o fim da vida. 
  • Não deixar de fazer o que gosta por ser complicado ou impróprio para a idade. Ou seja, não se isolar. 

Costumamos dar especial importância à celebração das décadas os 10, os 20, os 30, os 40, os 50... Porque damos tanta importância a estes aniversários? Devem ser comemorados de forma especial? Porquê?

O nosso cérebro detesta o caos e previne-se organizando a nossa vida em unidades de tempo bem determinadas. A divisão temporal em décadas é uma forma de estabelecer ordem cronológica e criar uma escala onde vamos arrumando os acontecimentos da nossa vida.

A par desta necessidade de organização interna, a divisão em décadas representa também a própria organização da sociedade estabelecendo aquilo que se convenciona ser apropriado e desapropriado a cada idade. Assim, cada década tem associada determinados pressupostos culturais, sociais e familiares, que devemos cumprir para nos sentirmos integradas e aceites.

Cumprir mais uma década e partir para uma nova é, desta forma, assumido como a passagem para uma nova fase onde é pressuposto que realizemos o que socialmente se convencionou caracterizar esse novo período. Como tal, é comum assinalarmos a entrada numa nova década da nossa vida de forma especial e mais efusiva.

O aniversário recorda-nos o conceito de renascer e festejá-lo é celebrar um novo começo. Um recomeço que se torna mais marcante quando iniciamos uma nova década de vida. Como tal, embora não sendo uma obrigatoriedade, cada nova década que iniciamos merece ser comemorada de forma especial.
Feliz Aniversário à Prevenir que completou, no mês desta edição, 10 anos!